A situação mundial mostra que todas as estratégias extremas
conduzem ao seu oposto. Esta situação é redundante e ocorreu em todas as
épocas, especialmente nos períodos de crise, e pode ser testemunhada nos mais
diversos quadrantes do mundo atual.
É assim que a incapacidade (ou impossibilidade) para
coabitar com Mursi, no Egipto, é pretexto para fazer ressurgir os militares, e
com eles a direita tradicional, laica quando lhe convém, aliada de extremistas
quando lhe dá jeito. Mas a intransigência da Irmandade Muçulmana em não
coabitar com o laicismo, pode constituir a sua liquidação enquanto partido moderado
de cariz religioso e reforçar o extremismo que tem latente. Um imbróglio perigoso.
É também por resultado da intransigência, da obstinação em
derrubar a todo custo uma das poucas lideranças laicas da região, que aos
poucos Bashar al-Assad consegue congregar à sua volta a população civil e “segura”
o seu exército, o que não deixa de constituir uma derrota para a ultra
reacionária Arábia Saudita e dos seus aliados, em especial os EUA, que não se
incomodam com a total ausência de democracia neste país, enquanto a reclamam
para a Síria, aonde pelo menos é possível professar qualquer outra região que
não o islamismo, ao contrário do que sucede na Arábia Saudita onde só o Islão é
permitido. E uma derrota também para o
estranho “socialista” Hollande que declara que "a França e a Arábia
Saudita têm análises e posições convergentes" no que respeita à “necessidade”
de derrubar Assad - mas não só -, mesmo
que para o efeito seja necessário armar a Al Qaeda… que combate afanosamente no
Mali.
Na América Latina, os extremos atraem-se, e, se não houver a
habilidade para conciliar interesses antagónicos das diversas classes - alguns
deles não tão antagónicos quanto podem parecer à primeira vista -, os
movimentos revolucionários podem ser minados de duas formas: por um lado, pelo
crescimento duma camada de oportunistas que exploram as benevolências e
ingenuidades revolucionárias criando brechas nas camadas mais pobres
beneficiárias das reformas. Por outro, pelo exploração dos receios das chamadas
classes médias, território no qual se abrigam e disfarçam os grandes interesses
da direita (financeira e aliada das corporações multinacionais). Os arautos do
retrocesso que, por inércia ideológica ou intencionalidade, permanecem nos “media”
– cada vez mais influentes entre as multidões – exploram as mais pequenas
contradições ou incidentes e camuflam ou baralham as grandes questões que
requerem raciocínio arguto, incompatível com a evasão sistemática…
É o que parece estar a acontecer na Argentina onde a
oposição ganha terreno nas principais regiões, ameaçando a liderança de Kirchner. O curioso - ou
talvez não -, é que os principais adversários partem de setores próximos do kirchnerismo
ou são dissidentes muito chegados a Kirchner. No Brasil a
direita clássica, a poucos meses das eleições presidenciais, cavalga
discretamente a onda de descontentamento, abrindo brechas na governação
progressista, tirando partido das suas contradições, das suas fragilidades
ideológicas, não hesitando em assumir valores caros à esquerda ou aos
movimentos cristãos. Na Venezuela, a oposição procura ganhar a iniciativa imitando
a agitação social do Brasil que contesta a corrupção. Os chavistas parecem
estar mais argutos e marcam manifestações para o mesmo dia e com o mesmo móbil,
mas, deviam ter sido eles a ter a iniciativa, deviam ter percebido que Caprilles
e tudo o que se abriga à sua sombra, iria avançar por aí. Meia vitória de
Maduro...
E
podiam multiplicar-se os exemplos que estão em evidência em todos os
continentes e pontos do globo. Claro está, Portugal não fica de fora. À
esquerda e à direita as clivagens estão a ser exploradas numa perspetiva de ganhar
uma quota maior de poder, para já, no próximo sufrágio, em setembro. Mas
enquanto a direita se aglutina, em alguns casos assumindo um discurso de “esquerda”,
a esquerda dispersa as suas energias acentuando as suas divergências, muitas
delas puramente retóricas.
A situação
atual é, uma vez mais – e desta vez mais dramaticamente -, escolher entre o mau
e o menos mau, ou o abstencionismo, mais ou menos niilista, que vai crescendo
entre nós. Sem dúvida que entre certos partidos, mais pelas suas lideranças do
que pela sua base eleitoral, que “venha o diabo e escolha”… Mas o que importa
são os resultados. As divergências à esquerda darão à direita, seguramente, uma
vitória, mesmo que relativa. Para a direita, nas circunstâncias atuais, até um segundo
lugar pode ser considerado uma vitória…
É
pois altura de em pôr em prática a famosa política de alianças que todos os
partidos fazem gáudio de possuir a melhor. O objetivo deve ser a convergência
que garanta o sucesso do partido com mais condições de ganhar,
independentemente das lideranças que existirem. Isto significa, bem entendido,
uma grande capacidade, de assumir quando necessário uma subalternidade
participativa mas também de engolir sapos…
É
preciso entender: De líderes de que não se gosta, com maior ou menor
dificuldade, o povo, mais tarde ou mais cedo, ver-se-á livre. Mas de tendências
políticas, isso é sempre mais difícil de
lograr – como mostra a experiência recente -, uma vez postas em marcha, ou
reforçadas.
Opções
difíceis que os portugueses têm pela frente. Exigem sapiência, paciência e
visão de futuro, mas que não aconselham as tais estratégias extremas, que
tendem a reforçar o oposto do que preconizam. Quanto a sapos, que eu saiba, não
há memória de que alguém tenha morrido com a sua ingestão. E alguns sapos
engolidos foram bem maiores dos que agora andam por aí…
Daniel D. Dias